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Cachorro com diarreia: O que fazer e quando ir ao veterinário

Cachorro com diarreia: O que fazer e quando ir ao veterinário

Cachorro com diarreia: O que fazer e quando ir ao veterinário

💩 Cachorro com Diarreia: Guia do Tutor para o Manejo Imediato e o Protocolo de Alerta Veterinário

Seja honesto, meu aluno: você já encontrou aquela surpresa líquida e malcheirosa no tapete e seu coração acelerou. A diarreia em cães é, sem dúvida, o problema gastrointestinal mais comum, e é o nosso principal indicador de que algo está errado no sistema digestivo. Como gastroenterologista, eu repito: a diarreia é um sintoma, não uma doença. Ela é a forma mais barulhenta que o intestino tem de dizer: “Me ajudem a expulsar esse invasor ou essa irritação!”.

O seu papel, nas primeiras horas, é fundamental. Você precisa manter a calma, agir com inteligência e saber traçar a linha entre o que pode ser resolvido em casa com uma dieta branda e o que exige a nossa intervenção imediata no hospital. Vamos juntos aprender a linguagem das fezes e transformar seu pânico em um protocolo de ação seguro e eficaz.


I. Introdução: O Intestino em Crise e a Velocidade de Reação

O intestino do cão é uma máquina absorvente e eficiente. Quando essa máquina falha, a diarreia acontece.

O que é a diarreia: Falha na absorção de água e eletrólitos.

O bolo fecal deve ser formado, principalmente, pela absorção de água no intestino grosso. A diarreia ocorre quando o movimento intestinal (motilidade) está muito acelerado, não dando tempo para a absorção da água, ou quando há uma inflamação ou infecção que impede a mucosa intestinal de absorver os fluidos e eletrólitos essenciais.

O resultado é a eliminação de fezes com alta concentração de água, que podem ser pastosas, moles ou totalmente líquidas. A diarreia não é o problema principal, mas sim a consequência de um desequilíbrio, seja ele alimentar, infeccioso, tóxico ou até mesmo emocional.

Diarreia Aguda vs. Crônica: Diferenciando a emergência do desafio diagnóstico.

Nós classificamos a diarreia de acordo com o tempo de duração, e isso dita a urgência. A Diarreia Aguda é a que começa de repente e dura menos de 7 a 14 dias. Na maioria das vezes, ela é autolimitada e causada por uma imprudência alimentar ou estresse, e é o nosso foco inicial de manejo.

Já a Diarreia Crônica é aquela que persiste por mais de três semanas ou é recorrente. Essa não é uma emergência de vida ou morte imediata (a menos que o cão esteja emagrecendo muito), mas é um desafio diagnóstico. A diarreia crônica é a principal suspeita de condições mais complexas, como Doença Inflamatória Intestinal (DII) ou problemas endócrinos. Se o problema se prolonga, o hospital é a próxima etapa.

O binômio Desidratação-Eletrólitos: Por que a perda de líquidos é o maior perigo.

O maior perigo da diarreia é a desidratação e o desequilíbrio eletrolítico. Com a eliminação constante de fezes líquidas, o cão perde grandes quantidades de água e minerais vitais, como o potássio e o sódio.

Em filhotes e cães pequenos, a desidratação pode se instalar em questão de horas e levar a um estado de choque hipovolêmico, que é fatal. A perda de potássio afeta a função cardíaca e nervosa. Por isso, toda a nossa estratégia inicial, seja em casa ou no hospital, é focada na reposição hídrica e eletrolítica. A diarreia é irritante, mas a desidratação é a assassina silenciosa.


II. O Protocolo de Detetive: Observando as Fezes e os Sinais

Antes de qualquer intervenção, você precisa ser o detetive e trazer as pistas para nós. O formato, a frequência e a cor das fezes dizem muito sobre a origem do problema.

A Escala de Bristol Canina: Diferenciando a diarreia de intestino delgado (volume) da de intestino grosso (frequência).

Nós usamos a observação para localizar o problema:

  • Diarreia de Intestino Delgado: O problema é na absorção do intestino delgado. O cão geralmente elimina grande volume de fezes, com baixa frequência (3 a 5 vezes ao dia), e pode haver perda de peso (pois a absorção de nutrientes está comprometida).
  • Diarreia de Intestino Grosso (Colite): O problema é no cólon. O cão elimina pequeno volume de fezes, mas com alta frequência (muitas vezes, com esforço e urgência), e as fezes podem conter muco (catarro) ou sangue vivo.

O volume e a frequência são nossos primeiros indicadores para direcionar a investigação: absorção (delgado) ou inflamação (grosso).

O Alerta do Sangue: Hematochezia (vermelho vivo) e Melena (preto) como emergências.

A presença de sangue nas fezes é um sinal de alerta gravíssimo que não pode ser ignorado.

  • Hematochezia (Sangue Vivo): É o sangue vermelho vivo e brilhante, que indica um sangramento na parte final do trato gastrointestinal (cólon, reto). A causa pode ser uma inflamação intensa (colite), parasitas ou o temido Hemorrágico Gastroenterite (HGE), uma emergência com alto risco de vida.
  • Melena (Sangue Preto): É o sangue digerido, que se parece com borra de café ou alcatrão. Isso indica um sangramento na parte superior do trato gastrointestinal (estômago ou intestino delgado). A melena sugere uma úlcera gástrica grave ou um sangramento intestinal alto.

Em ambos os casos, a perda de sangue, mesmo que pareça pouca, exige atendimento veterinário imediato para estabilizar o paciente e investigar a origem da hemorragia.

Pistas da Ingestão: Restos de lixo, plantas, ossos e a importância da Anamnese Alimentar.

O seu cão, como explorador que é, frequentemente é o causador da própria diarreia. Ao analisar as fezes, procure por restos de: ossos (que podem irritar a mucosa), lixo (alimentos estragados ou bactérias), ou plantas/folhas (que podem ser tóxicas).

Você também precisa fazer uma anamnese alimentar rigorosa: Ele comeu algum petisco novo? Roubou alguma comida gordurosa da mesa? A mudança brusca de ração é uma causa clássica. Essa informação é a “munição” que o veterinário precisa para começar o tratamento de forma certeira, seja ele desintoxicação ou apenas a dieta de resgate.


III. Manejo Imediato (As Primeiras 24 Horas)

Se o seu cão está alerta, sem vômito e sem sangue nas fezes, você pode começar o manejo em casa, seguindo o nosso protocolo.

Jejum Terapêutico Controlado: O descanso intestinal e as exceções (Filhotes e Cães Diabéticos).

O primeiro passo é dar um descanso intestinal. O intestino inflamado precisa de tempo para se acalmar e se regenerar, e a comida só piora a irritação.

Recomendamos um jejum total de alimentos sólidos de 12 a 24 horas para cães adultos saudáveis. Importante: O jejum não é indicado para filhotes (que têm baixa reserva de glicose e podem entrar em hipoglicemia) e para cães diabéticos (que precisam de comida para metabolizar a insulina). Nessas exceções, mantenha a alimentação leve, mas em porções mínimas. O jejum é para a comida; a água deve ser livremente disponível.

A Reposição Hídrica Inteligente: Água fresca, caldos leves e a importância do Potássio (Água de Coco).

A hidratação é a sua prioridade máxima durante o episódio de diarreia. O cão deve ter acesso constante a água fresca e limpa.

Para a reposição de eletrólitos, você pode oferecer água de coco natural (rica em potássio, que é perdido na diarreia) ou caldos de carne ou frango caseiros (sem sal, sem tempero e sem gordura) para tornar a hidratação mais atrativa. O objetivo é garantir que a ingestão de líquidos seja maior do que a perda pelas fezes. Se o cão se recusa a beber, isso é um sinal de alerta e você deve buscar a clínica.

Dieta de Resgate Pós-Jejum: O frango e o arroz: Alimentação branda, em pequenas e frequentes porções.

Após o período de jejum, a alimentação deve ser reintroduzida de forma gradual e leve. A Dieta de Resgate clássica é o arroz branco cozido (sem tempero, sem sal, sem gordura) misturado com peito de frango cozido (sem pele e desfiado).

O arroz é uma fonte de carboidrato fácil de digerir e o frango oferece proteína magra. Sirva essa dieta em pequenas porções (cerca de 1/4 da porção normal), 3 a 4 vezes ao dia. Se o cão tolerar essa dieta por 24 a 48 horas e a diarreia melhorar, você pode começar a misturar a ração normal gradualmente.


IV. Sinais de Emergência: Quando Correr para o Hospital

Nunca hesite em buscar ajuda profissional. Se você notar algum desses sinais, o tempo é o fator mais crítico.

A Tríade Fatal: Diarreia, Vômito e Letargia – O risco de Desidratação e Choque.

A presença de diarreia, vômito persistente e letargia (fraqueza) é a tríade fatal que indica um risco iminente de desidratação grave e choque. Se o vômito impede o cão de beber água, a desidratação se instala rapidamente.

O vômito também pode ser um sinal de obstrução intestinal ou de uma infecção viral grave. Nesse cenário, o cão precisa de fluidoterapia intravenosa para estabilizar os eletrólitos e a pressão arterial. Não tente tratar em casa; seu cão precisa de um acesso venoso e de medicação antiemética para sobreviver.

A Gengiva Pálida: Verificação do TPC (Tempo de Preenchimento Capilar) e o risco de Hemorragia/Anemia.

A cor da gengiva é um indicador vital da circulação sanguínea. As gengivas de um cão saudável devem ser rosadas e, quando você pressiona com o dedo, a cor deve retornar em menos de dois segundos (Tempo de Preenchimento Capilar – TPC).

Se as gengivas estiverem brancas, cinzas ou muito pálidas, isso é um sinal de choque ou anemia severa, muitas vezes causada por uma hemorragia interna devido à diarreia com sangue grave. Se o TPC estiver lento (mais de 3 segundos), o cão está desidratado e em choque. Verifique a gengiva imediatamente e corra para o hospital se notar palidez ou lentidão no TPC.

Sintomas Infecciosos Graves: Febre, Prostração e a suspeita de Parvovirose ou Cinomose (em não vacinados).

Se a diarreia (especialmente com sangue) vier acompanhada de febre alta, prostração total e dor abdominal, a suspeita é de uma infecção grave. Em filhotes, isso é o alarme máximo para Parvovirose, uma doença viral altamente contagiosa e frequentemente fatal.

A Parvovirose destrói o revestimento intestinal e exige tratamento intensivo com soro, antibióticos e suporte imunológico. Se o seu filhote não estiver com o protocolo vacinal em dia e tiver diarreia com vômito, considere isso uma emergência de vida ou morte e isole-o de outros cães.


V. O Papel da Microbiota e os Suportes Terapêuticos

Uma vez que a fase aguda é controlada, nosso foco se volta para a reconstrução da saúde intestinal.

Estratégia do Probiótico e Prebiótico: Repopulando a flora intestinal e fortalecendo o Trato Gastrointestinal.

A diarreia destrói o equilíbrio da microbiota intestinal (a flora). O uso de probióticos (micro-organismos benéficos, como o Lactobacillus e o Bifidobacterium) é crucial para restabelecer esse equilíbrio. Eles colonizam o intestino e competem com as bactérias patogênicas.

Os prebióticos (fibras não digeríveis, como a inulina) servem de alimento para os probióticos, estimulando o crescimento da flora benéfica. A combinação de probióticos e prebióticos, administrada após a fase aguda, acelera a recuperação da mucosa e fortalece a barreira intestinal.

Psyllium e Fibras Solúveis: Como a fibra correta auxilia na formação do bolo fecal e absorção de água.

As fibras solúveis têm a capacidade de absorver o excesso de água no intestino, ajudando a firmar as fezes. O Psyllium é um excelente exemplo de fibra solúvel.

Ele age como um agente de volume, “capturando” a água e dando mais consistência ao bolo fecal. Além disso, a fibra solúvel é fermentada pelas bactérias do intestino grosso, produzindo ácidos graxos de cadeia curta que nutrem as células do cólon. A suplementação com fibras solúveis, sob orientação veterinária, é uma excelente terapia de suporte em diarreias de intestino grosso (colite).

O Risco da Automedicação: A proibição de medicamentos humanos (Imodium, Buscopan) sem orientação veterinária.

Eu sou enfático: nunca use medicamentos humanos antidiarreicos no seu cão sem a nossa autorização! Medicamentos como o Imodium (Loperamida) ou o Buscopan (Escopolamina) reduzem a motilidade intestinal.

Se a diarreia é causada por uma toxina ou uma infecção bacteriana (como a Salmonella), o corpo está tentando expelir o veneno. Ao “prender” a diarreia, você está, na verdade, retendo a toxina no organismo do cão, piorando a intoxicação ou a infecção. O uso de Imodium também é particularmente perigoso em cães com a mutação genética MDR1 (como Collies e Pastores Australianos).


VI. Prevenção e Desafios Crônicos

A melhor forma de lidar com a diarreia é evitar que ela aconteça. O seu foco deve ser na higiene, vacinação e dieta.

Controle Parasitário Rigoroso: Vermifugação e vacinação como prevenção de Giardíase e Parvovirose.

A Giardíase (causada pelo protozoário Giardia) e a Parvovirose são causas comuns e graves de diarreia. Ambas são preveníveis.

A vacinação completa e atualizada é a única proteção contra o Parvovírus e o Cinomose. A vermifugação regular, conforme o protocolo do seu veterinário, é essencial para manter a carga parasitária baixa. Se você tem um filhote, a vigilância deve ser extrema, pois a diarreia de origem infecciosa pode ser fatal. A higiene ambiental, evitando o acesso a fezes de outros animais, também é vital.

Transição Alimentar Lenta: A regra dos 7 a 10 dias para evitar a irritação osmótica.

O intestino do cão é sensível a mudanças bruscas na dieta. Quando você introduz uma nova ração rapidamente, o trato gastrointestinal não tem tempo de produzir as enzimas digestivas necessárias, e a ração não digerida atrai água para o intestino (irritação osmótica), causando diarreia.

A transição alimentar deve ser feita ao longo de 7 a 10 dias. Comece misturando $75\%$ da ração antiga com $25\%$ da nova, e vá aumentando a proporção da nova ração gradualmente. Essa paciência preventiva é a maneira mais fácil de evitar uma diarreia por imprudência alimentar.

Diarreia Crônica e DII: A investigação da Doença Inflamatória Intestinal (DII) e a necessidade de Biópsia/Dieta Hidrolisada.

Se a diarreia persiste por mais de três semanas, estamos lidando com um caso de diarreia crônica, e o raciocínio muda. As causas mais comuns são: alergia alimentar ou Doença Inflamatória Intestinal (DII).

A DII é uma reação imunológica anormal que inflama cronicamente o intestino. O diagnóstico exige a exclusão de parasitas e, muitas vezes, uma biópsia intestinal (coletada por endoscopia) para confirmar a inflamação. O tratamento é complexo, envolvendo dietas hipoalergênicas ou de proteínas hidrolisadas (proteínas quebradas em pedaços tão pequenos que o sistema imune não as reconhece como alérgeno) e, em casos graves, imunossupressores.


VII. Conclusão: Disciplina e Segurança

A diarreia é uma batalha comum, mas que exige de você a disciplina de um bom enfermeiro e a inteligência de um detetive.

Chamado à ação: A observação salva vidas.

Lembre-se: Se o seu cão está alerta, sem vômito e sem sangue, você pode intervir em casa com dieta e jejum. Se houver qualquer sintoma sistêmico (fraqueza, vômito, febre) ou a presença de sangue nas fezes, o protocolo é emergência imediata. A rapidez da sua observação salva vidas, especialmente nos pequenos e nos filhotes.

A diferença entre um susto e um protocolo de emergência.

A maioria das diarreias é apenas um susto que passa em 48 horas com uma boa dieta de resgate. Seu papel é garantir a hidratação e manter o sistema digestivo em repouso. Onde há dúvida ou sangue, não hesite. O sucesso da gastroenterologia depende da sua ação.


Quadro Comparativo: Suportes Terapêuticos em Diarreia

Aqui está um quadro que compara as três principais ferramentas de suporte intestinal que você pode utilizar, sempre sob orientação do seu veterinário, na recuperação da diarreia.

Produto/SuporteObjetivo PrimárioVantagensDesvantagens/Riscos
Probiótico para CãesRepopulação da Microbiota IntestinalRestaura o equilíbrio da flora, acelera a recuperação da mucosa intestinal.Sem riscos; a eficácia depende da qualidade do produto e da cepa.
Psyllium/Fibras SolúveisFormação do Bolo Fecal e Absorção de ÁguaAjuda a firmar as fezes, nutre as células do cólon.Deve ser administrado com muita água para evitar obstrução. Não recomendado em obstrução.
Dieta de Proteínas HidrolisadasDiagnóstico/Tratamento de Alergias CrônicasAs proteínas são quebradas para não serem reconhecidas como alérgenos.Alto custo; só é eficaz se a diarreia for causada por alergia alimentar (DII).

Gostaria que eu fizesse uma pesquisa sobre os sintomas de Giardíase e Parvovirose em cães para que você saiba identificar essas emergências infecciosas em filhotes?

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